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O imperativo do gozo, o transbordar da irrefreável busca obsedante por das ding, a tela de Ernst retrata muito bem as profundezas abissais do gozo, seus movimentos, sua face, seu pleito pelo impossível reencontro com das ding.
Objeto perdido da espécie humana (Countinho, 2000), das ding é apresentado em 1895 como “neurônio A” em O Projeto para uma Psicologia Científica, texto Freudiano, relido por Lacan, mentor da noção de “objeto a”.
Referindo-se a das ding, Freud pensa no alvo da pulsão como sendo a satisfação, mas muito mais do que isto, minuta que esta satisfação já fora obtida um dia, em um dado momento na pré-história individual. No ímpeto de tentar reeditar esta satisfação primeva as evidências fulgurantes são as do impossível da satisfação, o real se faz presente (Roza, 2004).
Das ding não pertence ao espaço da representação, não habita o aparato psíquico designado por Freud, nem mesmo encontra-se em PSI pallium ou PSI núcleo, mas faz-se presente mesmo ausente. Irremediavelmente é esse objeto, das ding, enquanto o Outro absoluto do sujeito que buscamos reencontrar, mas por sua natureza ele é perdido para sempre. Um sinal, algo como índice da "Coisa" perdida entra em cena com Lacan, a saber, objeto a.
Amiúde, algo no nível das Vorstellungen sinaliza a Coisa. É um vazio tantalizador, testemunha de das ding e que não pode ser preenchido por objeto algum. Em seu Seminário VII Lacan nos brinda com a noção de "objeto a". Este não é das ding, mas testemunha deste como objeto perdido para sempre.
O "objeto a" não é objeto do desejo, mas sim o objeto causa do desejo. O objeto do desejo é a fantasia. Objeto a é, portanto, contornado pela pulsão, produtor da falta, índice da Coisa perdida da espécie humana (Roza, 2004).
Enquanto as formações do inconsciente são formações causadas pelo objeto, acabam por serem decifráveis, sendo uma enfermidade do tipo psicossomática o resultado de formações do objeto a, totalmente indecifráveis, pois neste caso o sujeito faz-se objeto. Para Lacan, o analista funciona como representante do objeto a, encontrando muitas dificuldades quando se vê subtraído de seu lugar de analista, a saber, quando o objeto retorna ao sujeito em outro lugar, no corpo (Násio, 1993).
Uma das dificuldades maiores reside no fato de que, nas afecções psicossomáticas, uma das dificuldades do analista para recolher esta formação do objeto a, que é uma enfermidade psicossomática, vem do fato de que o objeto retorna ao sujeito em outro lugar, como se o lugar do analista lhe fora subtraído (Násio, 1993, p. 102).
Násio (1993) lembra que o difícil nesses casos, é que esses pacientes não lhes demandam, tendo o objeto consigo, roubando-lhe o lugar de analista. Em pacientes graves ou de lesão, o objeto é uma espécie de excesso excessivo, um fora-do-corpo, objeto feito de um excesso de gozo.
O sujeito da fantasia é o sujeito escondido sob a forma do objeto. No sujeito da lesão ele passa a ser a própria lesão, o sujeito lesão, sujeito espasmo, etc.
No que tange as formações do objeto a, o objeto reaparece enxertado no corpo, como uma "besta" silenciosa, sob a forma de alucinação, passagem ao ato ou de uma lesão de órgão.
No imperativo do gozo aloja-se a tétrica procura por das ding, a ausência de demanda se faz presente. Seria possível pensar em uma terceira tópica?Bibliografia:
FREUD, S. O Projeto para uma Psicologia Científica. In: Edição standard brasileira das obras complestas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1895.
JORGE, M A. C, Fundamentos da Psicanálise - De Freud a Lacan. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2000
NASIO, J.D. Psicossomática: As Formações do Objeto a. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004
ROZA, G. Introdução à Metapsicologia Freudiana. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004.